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Cultura Pop no Brasil | Cid Moreira, ETs e palhaços das trevas vitaminam a nova fornada de filmes nacionais

Além de Jabor, Shakespeare por Welles e mais

13.11.2015, às 10H32.
Atualizada em 25.11.2016, ÀS 12H07

A Voz de Deus

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Presença cativa nos lares brasileiros ao longo dos 27 anos em que foi âncora do Jornal Nacional e dublê da voz de Deus em seu trabalho como locutor dos versículos do Velho e do Novo Testamento em CDs da Bíblia Sagrada, o jornalista Cid Moreira será tema de um documentário longa-metragem batizado em referência à sua frase mais popular: Boa Noite! A direção será de Clarice Saliby, que dirigiu o aclamado curta Efeito Casemiro (2013) e a produção é da TV Zero, da dupla Rodrigo Letier e Roberto Berliner, responsáveis por sucessos como Bruna Surfistinha (2011).

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O projeto parte da figura de Cid para traçar a História dos meios de comunicação no Brasil”, diz Letier.

Uma nova face para o terror

Nem só de Zé do Caixão e dos zumbis dos mangues capixabas de Rodrigo Aragão vive a fauna de seres macabros do cinema de horror brasileiro: a partir desta quinta-feira, 12 de novembro, Cangaço, um palhaço com a cara maquiada de sangue vai entrar para o rol das diabruras do Além no país. Interpretado pelo (genial) ator Francisco Gaspar, Cangaço, um clown cheio de mistério, conduz nosso olhar às catacumbas do medo em Condado Macabro, produção de R$ 400 mil filmada ao longo de 40 dias em Parnaíba, no Mato Grosso do Sul pelos diretores Marcos DeBrito e André Campos Mello. O prêmio de melhor filme nacional no Fantaspoa, o festival de cinema fantástico de Porto Alegre (RS), coroou o arranjo narrativo da dupla de cineastas em referência ao terror feito nos EUA nos anos 1970 e 80, por Tobe Hoper, Wes Craven e mestres afins. Esse diálogo com a tradição, associado ao desempenho arrebatador de Gaspar, rendeu ao longa aplausos em mostras na Espanha, na Holanda, no México, na Argentina e na Colômbia, consagrando-se de fora para dentro aos olhos do mercado externo. 

A influência dos filmes de horror daquelas décadas nos levou a ideia de reproduzir o visual sujo da película no digital, trabalhando todos os clichês de época. E uma das influências mais fortes foi O Massacre da Serra Elétrica”, explica DeBrito, que verteu o enredo de Condado Macabro em forma de um romance homônimo, a ser editado pela Simonsen, levando coágulos derramados às livrarias. “No esforço para dialogar com os estereótipos do gênero terror, a figura do palhaço dialoga com cults do passado como Pague Para Entrar, Reze Para Sair feitos na década de 1980. E um personagem nosso, Jonas, foi batizado com um nome que quase um anagrama de Jason, de Sexta-Feira 13outra referência emblemática”.

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Na trama, um grupo de jovens, incluindo a beldade Lena (Bia Gallo), o galã Théo (Leonardo Miggiorin) e o casanova Beto (Rafael Raposo) alugam uma casa no interior para curtir um feriado de folga. Mas o local será o palco de uma chacina, envolvendo um criador de porcos que alimenta seus bichinhos com carne humana. Visualmente, o longa combina uma edição com frenesi de videoclipe com tomadas de realismo quase documental. “Esse realismo não foi uma busca e sim consequência da maneira como filmamos, reunindo todos em uma locação para minimizar os custos”, explica Mello.

Sem medo de espalhar tripas pela tela nem de desafiar os limites das caixas acústicas das salas de exibição com gritos de pânico, Condado Macabro leva o cinema de horror brasileiro a uma dimensão de risco criativo cujo saldo é um thriller que assusta mas também rouba risadas, ao flertar com a comédia. “Este filme transita do besteirol para o Inferno, mas o lado cômico, de piada, veio de modo natural, sem forçar uma caricatura”, explica DeBrito.No Brasil, pela falta de intimidade em explorar gêneros que não a comédia, os distribuidores têm dificuldade de abrir espaço para as diversas vertentes do terror. Veja o caso do Rodrigo Aragão, diretor de Mar NegroEle tem filmes distribuídos com sucesso em vários países mas não consegue ser lançado aqui”.

Sinais de vida inteligente... no cinema catarinense 

Lembra de Sinais (2002), filme de M. Night Shyamalan no qual Mel Gibson era um clérigo às voltas com a presença de ETs na Terra? O primeiro indício da aparição de extraterrestres eram figuras geométricas desenhadas em campos de trigo como se fossem uma cartografia aeronáutica para pilotos: são os chamados agroglifos. Foram encontradas formações circulares semelhantes em uma plantação de trigo de Ipuaçi, uma cidade de 10 mil habitantes no interior de Santa Catarina. Esse é o tema do filme Círculos, um documentário atualmente em fase de montagem, com direção de Cíntia Domit Bittar e já negociado com o History Channel. A produção é da Novelo Filmes.

“Nossa intenção com o documentário Círculos vai além de investigar o fenômeno em si, como faz a maioria dos documentários relacionados a temas que envolvem extraterrestres ou qualquer assunto da ufologia. Queremos explorar a questão de os agroglifos aparecerem justamente em Ipuaçu, no interior de Santa Catarina. A partir dessa localização, queremos investigar não somente os sinais, mas a reação dos habitantes ao se defrontarem com o fenômeno mais uma vez, em outubro de 2015”, explica Cíntia, realizadora do curta Qual Queijo Você Quer?, vencedor do Festival do Rio 2011. “O comportamento dos moradores eleitos como personagens será registrado a partir de uma câmera observadora e cúmplice, curiosa para saber mais sobre as teorias e as especulações em torno do assunto. Esse olhar se voltará também para pesquisadores que estudam os sinais, mas nunca em tom professoral - serão abordados como pessoas comuns diante de um evento aparentemente sem explicação concreta. O que quer que sejam esses círculos - ou qualquer que seja sua origem - o que nos interessa é as relações estabelecidas entre as figuras e as pessoas”.

Os agroglifos de Ipuaçu foram avistados pela primeira vez em outubro de 2008. “Há quatro anos, eu acompanho os agroglifos de Ipuaçu. Em março deste ano, eu e mais três colegas saímos em uma viagem de pesquisa a fim de reconhecer personagens e locais para formatar o projeto do filme”, explica Cintia. “Um dos meus objetivos é transmitir ao espectador aquilo que sentimos durante esse reconhecimento. Nossa opinião sobre o assunto variava o tempo todo, conforme conhecíamos as pessoas e suas especulações, sua teorias, ou suas explicações mais simplórias para o fenômeno”.

Ser ou não ser

Bunker de resistência para a autoralidade cinematográfica no formato DVD, a Versátil, distribuidora sob a curadoria do pesquisador Fernando Brito, lança até o fim do ano o box Shakespeare por Welles, reunindo três clássicos do diretor de Cidadão Kane (1941) sobre o universo teatral do bardo inglês: Falstaff: O Toque da Meia-Noite (1965), Othello (1952) e Macbeth: Reinado de Sangue (1948).   

Mais Jabor

Distante das telas como diretor desde A Suprema Felicidade (2010), o comentarista da TV Globo Arnaldo Jabor acaba de finalizar um roteiro novo, com poucos personagens e de temática mais intimistas, para levantar produção nos próximos meses.  

O Barão Othelo no barato da memória

Sucesso em São Paulo, a mostra O Maior Ator do Brasil – 100 Anos de Grande Othelo se muda para o Rio de Janeiro, para a Caixa Cultural, no próximo dia 17, resgatando a memória de Sebastião Bernardes de Souza Prata (1915-1993). A seleta de filmes abre com um clássico do cinema moderno no país: o drama Rio Zona Norte (1957), dirigido por Nelson Pereira dos Santos. Serão exibidas ainda raridades como O Negrinho do Pastoreio (1973), de Antônio Augusto Fagundes, e O Rei do Baralho (1974), de Julio Bressane.

Na bossa do sambalaço

Variante do samba, sem vetores ideológicos, mas de alta voltagem rítmica, o gênero sambalanço, responsável por lotar bailes no Brasil da virada dos 1950 para 60, vai ser tema de um documentário dirigido por Fabiano Maciel com roteiro e entrevistas feitos pelo maior crítico de música do país: Tárik de Souza. O filme, ainda em andamento, vai trazer um registro raro do compositor e arranjador Ed Lincoln (1932-2012) na ativa nos palcos. Já foram entrevistados cantores como OrlandivoElza Soares e Miltinho. Estão ainda na fila para falar com o diretor Celso Murilo Lafayette

Pedofilia em foco

Estruturada a partir do abuso sexual, a relação de um adolescente (Nicolas Sambraz) e um homem mais velho com quem vive desde garoto (papel de Gerson Delliano) é o mote para uma discussão sobre pedofilia empreendida pelo longa-metragem UrutauFilme de estreia do diretor carioca Bernardo Cancella Nabuco, a produção vai estar no menu da Semana dos Realizadores (19 a 25 de novembro no Rio). Com um domínio preciso dos enquadramentos e uma inquietação existencial de maturidade rara para um cineasta iniciante, Nabuco faz um ensaio sobre a solidão a partir do desejo.

Da Rússia para Búzios

Produtora responsável por fenômenos da bilheteria como a franquia Se Eu Fosse Você, a Total Filmes vai exibir no Festival de Búzios, realizado nos dias 25 e 26 de novembro no litoral do Rio de Janeiro, uma releitura à moda brasileira para um sucesso de bilheteria da Rússia: Moya Bezumnaya Semya (We Are Family), de 2012. O longa nacional se chama A Família Perfeita e tem direção do fazedor de blockbusters Felipe Joffily (de E aí, comeu?). Com base no roteiro russo foi criada uma nova trama, voltada para o lado B do convívio entre parentes. O elenco inclui talentos como Otávio AugustoZezé Polessa eAntonio Calloni. A Total vai aproveitar a passagem por Búzios para exibir Apaixonados, de Paulo Fontenelle, com Nanda Costa Raphael Viana.  

CURTA ESSA

Amassa que Elas Gostam, de Fernando Coster: Dia 18 de novembro, ao meio-dia, o Canal Brasil exibe um marco do cinema de animação do Brasil, eleito melhor curta no Festival de Brasília de 1998. Na produção, uma mulher (Malu Bierrenbach) cai de amor por um astro de filmes pornográficos. O detalhe: ele é um boneco de massa. O filme vai ser reprisado no dia 22, às 8h40m. 

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*Com DNA luso-pop-suburbano carioca, Rodrigo Fonseca é crítico de cinema, roteirista e professor de história das narrativas audiovisuais, com dupla cidadania na Terra-Média de Tolkien, e nos rincões da Atlântida de Aquaman. Michel Gondry é o seu Godard e a pornochanchada, a sua alegria nas horas de solidão.

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