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Cultura Pop no Brasil | Yes! Nós temos vampiros de novo

Vampiro Carioca deixa a TV e parte para o cinema

06.08.2015, às 00H46.
Atualizada em 01.12.2016, ÀS 05H03

Desde os anos 1980, quando As Sete Vampiras, de Ivan Cardoso, levou multidões de fãs do terrir às salas de exibição, o cinema brasileiro perdeu sua intimidade com os bebedores de sangue que imperam no reino das trevas. De lá pra cá, o horror verde-amarelo deu chance a zumbis, fantasmas, ao eterno Zé do Caixão, mas nada de crias do Conde Drácula. Chegou a hora de mudar isso, com a ajuda do compositor Fausto Fawcett.

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Responsável pelo sucesso "Kátia Flávia", o músico é o protagonista (e criador do universo) de Vampiro Carioca, um exercício de terror gore da melhor extirpe sangue-tripas-sexo-rock 'n' roll dirigido com um ritmo feroz de videoclipe por Marcelo Santiago, com um padrão de criatividade visual inusitado na América Latina. Sob uma fantasia pop, a saga de Vlak (Fawcett), traficante de um pó vampírico capaz de dar um gostinho de imortalidade a seus usuários, serve para o cineasta fazer uma crítica aos desgovernos da geopolítica do Rio de Janeiro, com cenas de ação dignas de Blade (1998).

"O maior desafio na realização do Vampiro Carioca foi a construção do universo criado pela prosa fantástica do Fausto Fawcett. Se fôssemos filmar literalmente o que ele escreveu, teríamos um filme do porte de um Mad Max, por exemplo", diz Santiago, que rodou o filme em parceria com o Canal Brasil, que antes formatou Vampiro Carioca como uma série de três temporadas em 2010. "A elaboração do espaço ficcional uniu a criação estética, incluindo cenografia e iluminação, com a seleção e condensação dos textos do Fausto, feito em parceria com ele mesmo. As escolhas estéticas e plásticas tiveram como ponto de partida as referências dos quadrinhos, em especial o Gato Fritz, de Robert Crumb, daí o uso de máscaras em muitos personagens."

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No Rio notívago criado por Fawcett, Vlak encara um concorrente chamado Limboman (interpretado pelo também músico Laufer) na luta pela comercialização do pó de vampiro. Ele cruza com guerreiros da noite como Draco (vivido por Otto Jr., um dos atores mais aclamados do teatro brasileiro) e a predadora Dafne Cortante (Linn Jardim). Entre eles, surge uma loura fatal chamada apenas de Michele (Renata Davies) a quem todos cobiçam. "Radicalizamos nossa opção estética filmando tudo em estúdio com os cenários projetados numa tela ao fundo, na técnica de back projection, para criar uma certa irrealidade nos ambientes", explica Santiago. "Optamos também pelo minimalismo com relação aos objetos de cena, quase como no Teatro Nô, onde cada objeto é simbólico e funcional. Tudo isso provocou algumas dificuldades técnicas, mas favoreceu a construção das atmosferas."

Previsto para iniciar sua carreira pelo exterior a partir de 2016, Vampiro Carioca foi construído com inspiração em dois filmes que influenciaram o olhar de Santiago: A Dança dos Vampiros, de Roman Polanski, e Nosferatu, de Werner Herzog. "Meu filme tem um pouco da irreverência do primeiro e das questões existenciais do segundo. Vi dezenas de outros filmes de vampiro, mas aqueles dois são os que mais me marcaram. Acho que esse universo abre enormes possibilidades criativas, pois, se os vampiros existem, tudo é permitido. Todas as histórias podem acontecer, os personagens podem revelar seus lados mais ocultos e obscuros. Assim, o que é estranho e inquietante pode tomar corpo e forma e nos fazer refletir sobre a existência humana", completa o diretor.

Já que o assunto é vampiro...

Mais bem-sucedido autor de livros de terror do Brasil, com um milhão de exemplares vendidos entre 14 títulos lançados, como o vampírico Os Sete, o paulista de Osasco André Vianco entrega até o fim de agosto os originais de seu 15º romance: Estrela da Manhã. Na trama, um jovem vítima de bullying descobre na Internet um aplicativo para o aluguel de fantasmas e acaba libertando um demônio assassino. O livro chega às livrarias em outubro.

Salada russa

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Diretor do premiado Além da Estrada (2010), o também ator Charly Braun está finalizando um novo longa-metragem, rodado em terras eslavas: Vermelho Russo. A produção reúne três talentos brasileiros no elenco: Maria Manoela, Martha Nowill e Michel Melamed. Além deles, a produção, baseada no diário de Nowill, escalou a portuguesa Soraia Chaves. Na trama, Marta e Manu são duas jovens atrizes paulistanas que vivem entre o reconhecimento da classe artística e o anonimato perante o grande público. A fim de se aprimorar, elas decidem se embrenhar no rigoroso inverno de Moscou para estudar teatro com um renomado mestre russo.

Entre neve, brigas, amores, personagens de Tchekov e muitos litros de vodka, elas são constantemente testadas pela crueldade do teatro e por uma Rússia majestosa e difícil. "Será uma experiência que vai transformá-las para sempre", diz Charly Braun, que mesclou técnicas de documentário ao projeto. O filme vai ser lançado em 2016 pela Vitrine Filmes.

Corrida pela Première Brasil

Vitrine competitiva do Festival do Rio, cuja edição deste ano vai de 1 a 14 de outubro, a Première Brasil 2015 teve um recorde de inscrições: só de ficções foram 154 candidatos à disputa de melhor filme nacional. Nada se sabe ainda dos competidores, mas estima-se a presença de Quase Memória, de Ruy Guerra, Senhora das Imagens, de Roberto Berliner, e de Introdução à Música do Sangue, de Luiz Carlos Lacerda, este em disputa no 43º Festival de Gramado, que começa nesta sexta-feira na Serra Gaúcha. Especula-se ainda que As 1001 Noites, produção portuguesa de seis horas de duração, dirigida pelo lisboeta Miguel Gomes e recebida como um fenômeno em Cannes, estará na seleta do Rio.

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Falando sobre Ruy Guerra...

Radicado no Brasil há cerca de seis décadas, o cineasta moçambicano é tema de uma experiência narrativa de longa metragem - híbrida de documentário e ficção - já em fase final de montagem, com direção de Diogo Oliveira e Bruno Laet, batizada O Homem que Matou John Wayne. A produção brinca com o fato de Guerra ser fã de westerns desde menino. Na trama do docudrama, ele já é um famoso diretor quando tem um encontro casual, em um corredor de bar de Los Angeles, com o ator símbolo tanto dos filmes que amava quanto do imperialismo que detestava. A confissão desse assassinato metafórico abre a caixa de Pandora da obra do mais singular realizador latino-africano de nosso tempo. "Ruy é um desbravador da linguagem fílmica, fundamental para a formação de um pensamento imagético brasileiro", diz Oliveira.

Laertevisão

Um dos filmes latino-americanos mais aclamados da leva nacional exibida no Festival de Roterdã, na Holanda, nos últimos anos, Periscópio, de Kiko Goifman, entra em cartaz no dia 27 de agosto, contando com um mimo luxuoso: um cartaz feito pela cartunista Laerte. A produção acompanha as pelejas de dois homens de diferentes classes sociais (João Miguel e Jean Claude Bernardet) em um apartamento num momento que o mundo parece estar com os dias contados, sem manifestações da vida humana. Eis que o periscópio do título brota na casa deles.

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Poesia em documento

Principal diretor de fotografia do país desde a Retomada, o paraibano Walter Carvalho acaba de finalizar seu novo longa-metragem como realizador: O Desmaio da Planície, um documentário sobre o poeta carioca Armando Freitas Filho, autor de livros como Fio-terra, Lar e Máquina de Escrever. O filme mescla observação biográfica com reflexões estéticas sobre a dinâmica de Armando para a criação de versos. Ainda inédito em circuito, o longa anterior de Carvalho, chamado Filme de Cinema, vai abrir a 48ª edição do Festival de Brasília, em sessão hors-concours, no dia 15 de setembro.

CURTA ESSA

Guida

É cedo pra burro - 7h55m deste domingo! – a sessão de Guida, no Canal Brasil. Mas vale madrugar para curtir este ensaio sobre jovialidade da animadora Rosana Urbes, centrado na luta de uma senhora de terceira idade para redescobrir sua própria beleza e seu amor próprio. A produção ganhou o prêmio de melhor filme de estreia no Festival de Annecy, na França (o mais importante do mundo no setor de animação), de onde saiu ainda com uma menção honrosa votada pela Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica (Fipresci). Guida volta a ser exibido no dia 12 de setembro, às 22h.

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*Com DNA luso-pop-suburbano carioca, Rodrigo Fonseca é crítico de cinema, roteirista e professor de história das narrativas audiovisuais, com dupla cidadania na Terra-Média de Tolkien, e nos rincões da Atlântida de Aquaman. Michel Gondry é o seu Godard e a pornochanchada, a sua alegria nas horas de solidão.

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