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Sérgio Bianchi é brasileiro, ele não desiste nunca.
As obras do cineasta paranaense sempre se esforçam em mostrar que, por trás da simpática idéia do jeitinho brasileiro, existe uma hipocrisia que permeia a rotina nacional. Cronicamente inviável (2000) fez sua ácida constatação da dominação e da opressão social no Brasil. Agora em Quanto vale ou é por quilo? Bianchi utiliza-se do recurso de histórias intercaladas para, mais uma vez, apontar o dedo acusatório contra seu segmento preferido para levar pancadas: a classe média.
E ironiza um elemento social de benemerência quase intocável: o terceiro setor. Na visão de Bianchi, ONGs são terreno fértil de corrupção, caixa dois, projetos falidos que só servem para contabilizar a pobreza como forma de negócio. Pior. São uma forma de perpetuar a miséria - daí as comparações com o período escravagista do país.
Livre adaptação do conto machadiano Pai contra mãe, o filme começa no século XVIII, quando senhores atrelavam ao custo da liberdade de seus escravos um juro crescente ao ano. O que parecia boa vontade virava negócio muito lucrativo - coisa que Bianchi mostra acontecer hoje em dia, quando uma ONG fictícia superfatura a doação de computadores bichados a uma escola de favela.
No período colonial, para sobreviver decentemente, negros viravam capitães-do-mato para caçar escravos fugidos. Bianchi também espelha o caso negro-contra-negro dos dias de hoje. O caçador virou matador de aluguel. É o desfecho dramaticamente poderoso de um filme que até então se escora mais no sarcasmo - mais uma vez para mostrar que no Brasil nada muda, nunca.
Tudo é negócio para a classe média enfastiada, atrás de alívio de consciência, de posar com o menino carente em fotos oficiais, uma cultura que cresceu no país da Era FHC: onde o estado é incompetente, coloque-se lá você (de preferência com um bom projeto que consiga a famosa captação de cifras do governo rapidamente).
A sugestão é a ferramenta de Bianchi, um ótimo provocador, geralmente inconsequente. Ele evita encerrar discussões, tanto que deixa pontos abertos a uma ou duas interpretações - quem acompanhar os créditos finais saberá. O saldo pende mais para o cinismo do que para o drama, mas é de humor mesmo, de brincadeiras com fundo de verdade, que precisamos para esquecer da nossa eterna vocação para perdedores.
Ano: 2005
País: Brasil
Classificação: 14 anos
Duração: 110 min
Direção: Sérgio Bianchi
Roteiro: Sabina Anzuategui, Eduardo Benain, Sergio Bianchi, Newton Cannito
Elenco: Antonio Abujamra, Caio Blat, Herson Capri, Marcelia Cartaxo, Leona Cavalli, Caco Ciocler, Joana Fomm, Ênio Gonçalves, Silvio Guindane, Leonardo Medeiros, Cláudia Mello, Danton Mello, Zezé Motta, Bárbara Paz, Ana Lúcia Torre