Laerte e Angeli | Como eles se tornaram dois dos maiores quadrinistas do Brasil

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Laerte e Angeli | Como eles se tornaram dois dos maiores quadrinistas do Brasil

Quadrinistas começaram a trabalhar nos anos 70 e, agora, voltam a parceria com a Revista Baiacu

11.08.2017, às 16H35.
Atualizada em 10.06.2019, ÀS 12H03

Laerte Angeli tornaram-se dois dos maiores nomes do quadrinho nacional graças a personagens com humor ácido e tirinhas que tornaram-se clássicas em publicações de jornais e revistas. Depois de anos, a dupla se reúne mais uma vez para criar a Baiacu, uma revista que pretende trabalhar ideias mais profundas e discutir temas atuais que estão fora da grande mídia. A dupla, que se diz movida a renovação, não quer repetir um passado repleto de inovação e história.

Os dois se conheceram no início dos anos 70, mas o contato profissional aconteceu pouco depois quando Laerte estava trabalhando na Revista Balão, uma publicação pioneira no mundo das HQs no Brasil e que revelou artistas como Luiz GêXalberto e irmãos Caruso“Convidamos o Angeli para fazer uma história e ele fez um quadrinho de duas páginas muito legal, acho que era sobre umas moscas que ficavam andando pelo banheiro”, afirmou Laerte ao Omelete.

Apesar da afinidade, a dupla acabou se separando por conta da distância – Angeli era da Casa Verde (Zona Norte) e Laerte ficava na região de Pinheiros (Zona Oeste), em São Paulo – e, apesar de mais algumas parcerias, a Balão acabou fechando após a nona edição. Contudo, logo o caminho dos dois se cruzaria novamente. Eles acabaram se encontrando no lugar mais inusitado possível: trabalhando com cartões de presente.

“Isso foi moda na época. Era um mercado de trabalho bom pra gente. Fazíamos cartão de aniversário, de melhoras, de declaração de amor, essas coisas”, explicou Laerte. Muitos desses cartões utilizavam a linguagem de cartoon característica da dupla, que pouco depois começaria a trabalhar em grandes mercados de imprensa.

Logo em 1973 Angeli foi contratado pela Folha de São Paulo, enquanto Laerte passou a prestar serviços para revistas como Placar e a Gazeta Mercantil. Ambos começaram a se transformar em nomes conhecidos no meio de charges e, em 1983, voltariam a colaborar em um dos projetos mais ousados da década.

Circo Editorial lançou a revista Chiclete com Banana, considerada até hoje um dos quadrinhos adultos mais importantes do Brasil. Editada por Toninho Mendes (1954-2017), a publicação contou com participação de nomes como Luiz Gê, Roberto PaivaGlauco e, claro, Laerte. Com um ambiente descontraído e inovador, a revista publicou alguns dos melhores trabalhos dos artistas e revolucionou o mercado. “Adorava trabalhar lá. Foi onde eu criei os Piratas do Tietê e onde começamos mesmo a nos conectar”, lembra Laerte.

A revista começou com uma tiragem de 20 mil exemplares e teve picos de mais de 110 mil. Além dos Piratas, nasceram também personagens como Os Skrotinhos, Geraldão Rê Bordosa, que ficaram conhecidos pelo público e contam com fama até os dias de hoje. Contudo, um grupo de personagens marcaria para sempre a vida de Laerte, Angeli e Glauco: Los Três Amigos.

“Em um determinado momento, houve uma comemoração da terceira ou quarta revista de Chiclete com Banana e resolvi fazer um especial para mostrar o quanto já se produziu. Passei em uma locadora e vi um videocassete do Three Amigos, uma comédia com bandoleiros, e pensei: vou fazer um grupo de bandoleiros. Quando mostrei a ideia para o Laerte ele falou: ‘isso dá coisa, por que não fazemos uma revista especial?’’, afirmou Angeli ao Itaú Cultural.

Rapidamente, o trio produziu uma revista especial e lançou sem nenhuma pretensão, com a ideia de que fosse uma edição única. Contudo, a primeira história emplacou e o público começou a ligar para redação da Chiclete com Banana para saber quando haveriam mais revistas e os três começaram a se reunir no estúdio de Angeli para montar os personagens – que começaram a ganhar cada vez mais características dos seus criadores. “O Glauco era o cara que não aparecia, chegava atrasado, o Laerte era quem ia embora antes e eu era o cara que tinha de arrumar tudo depois. Então a gente colocava tudo isso no roteiro”, explicou Angeli.

Chiclete com Banana durou dez anos, sendo finalizada em 1995 com mais de três milhões de cópias vendidas e entrou para história do quadrinho nacional. Angeli e Laerte seguiram em caminhos diferentes e, agora, voltarão a colaborar em mais um novo projeto.

Muita coisa mudou desde o fim da Chiclete com Banana. Laerte passou por um processo de transição de gênero, e problemas pessoais levaram Angeli à depressão, doença que o fez a deixar a Folha de São Paulo após mais de 30 anos. Agora, os dois se reencontram em um projeto inusitado que reúne novos artistas, novas ideias e novos conceitos não apenas para o quadrinho, mas para a arte em geral: A Revista Baiacu.

Buscando a experimentação, a publicação começou com uma residência artística e de atividades realizadas pelo Sesc-SP. Durante o mês de julho, dez dos artistas convidados ficaram imersos em uma casa para criação das histórias em quadrinhos, de novas ilustrações e textos supervisionados pela dupla.

Com um grupo heterogêneo, que tem a participação de quadrinistas da velha guarda e até nomes mais novos, o projeto conta com talentos como Bruna Beber, que terá uma seção de poesia; André Sant’Anna, que terá uma coluna para defender de uma maneira irônica uma figura pública “indefensável”; e o escritor Daniel Galera, que deve publicar seus contos. “Essas pessoas são uma surpresa deliciosa para gente, pois sabemos que vai aparecer uma coisa interessante”, explica Laerte.

No site oficial, é possível acompanhar todo o processo de criação que contou com vídeos e fotos especiais sobre um projeto que começou a nascer de maneira orgânica. “Ninguém sabe direito para onde ele vai. Estamos todos tateando enquanto fazemos e tudo é possível – pode sair algo terrível e ou algo fantástico”, brincou Rafael Coutinho, filho de Laerte e um dos responsáveis pela Baiacu.

Contudo, Laerte acredita que dificilmente a revista não dará certo. A liberdade criativa dada aos artistas e o sentimento de inovação do projeto animam a quadrinista, que acredita que a revista poderá explorar o humor como ela sempre viu. “O humor é uma coisa mais ou menos eterna. Humor é uma categoria de expressão tão ampla e profunda quanto literatura. Falar que a literatura precisa se reformular por conta dos tempos, não é verdade. Os tempos são outros, o que está acontecendo apresenta desafios diferentes a quem está disposto a olhar as coisas de uma forma crítica. O humor é uma linguagem, uma linguagem riquíssima”.

Baiacu será lançada em novembro pela editora Todavia e o site oficial mostra todo sobre o novo projeto dos quadrinistas, que fizeram história com um humor ácido, crítico e atual. 

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